quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O ZERO INFINITO

Os dias todos alinhados, em ar de marcha
Porque é preciso despachar os poemas num instantes

Antes que eles murchem e se partam pelas asas.


É preciso empurrar os olhos para a frente

Em direcção aos filhos que estão por abrir,

Para que eles atravessem de novo as pontes

Que estão agora a ruir pelo peso do nosso sono.


E as palavras todas a pingar pelas paredes abaixo

Como se fossem chuva disparada por canhões de guerra

Que não se podem render diante de um silêncio obrigatório.


É difícil abrir passagem por entre os pensamentos apertados,

Há instantes em que nem uma clave de sol

É capaz de entrar no buraco da partitura.


Ninguém pára porque os olhos estão sempre verdes

E os cruzamentos são lugares de velocidade máxima

Com as árvores e as girafas todas em contramão,

Os cruzamentos são esquinas redondas

Onde os polícias e os larápios atacam ao pôr-do-sol

Vestidos com as mesmas fardas e os mesmos apitos.


Já há não como distinguir as palavras umas das outras,

Todas as batalhas são geometricamente iguais,

Com as mesmas medidas e as mesmas sílabas tónicas.


Custa a acreditar, mas ninguém sabe a idade do tempo

E ainda que se façam múltiplas equações

Não se há-de encontrar o comprimento do futuro que falta

Porque tudo é eterno como a numeração romana.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

MAIS UM ADEUS


Procuravas onde te esconde
Mas a vida não tem portas de fechar por dentro
Só os olhos

Fechaste-os para sempre.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

MARCAS

Fez um X nas costas da mão para servir de aviso. Mas passou a tarde toda a tentar lembra-se daquilo que não se podia esquecer. À noite, esfregou com muito sabão para conseguir dormir.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

COMO ESCREVER UM GUIÃO

Depois de ter afiados os lápis todos
Apagou a televisão e foi dormir

No meio da noite descobriu que não tinha dedos

Apenas uma almofada cheia de diamantes


Por não poder voltar atrás na vida

Teve de andar com o filme para a frente

Até que o Sol nasceu e se viu a cabeça de um leão

Era o leão da Metro-Goldwyn-Mayer

Nessa altura apareceram nuvens altas

E o Sol desligou-se com um enorme rugido


Os braços espreguiçaram-se para puxar uma ideia

Mas o mundo ficou tão grande

Que a partir daquele instante seria difícil imaginar

Um argumento válido para continuar a viver

Um argumento que fosse credível e original


Ainda assim os lápis estavam todos afiados até ao limite

Por isso era complicado escolher outros desafios


Finalmente um cowboy entrou na história

E deu um tiro fulminante

Que deixou o ar impregnado de tanta pólvora

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

ESTA MESMO MUITO FRIO

Hei-de ficar velha sem perceber como é possível aturar um país onde existe algo que se designa de “escolaridade obrigatória”.

Os miúdos, sobretudo os mais crescidos, deviam ir para escola com a mesma vontade com que vão para uma noite de karaoke ou isso.